A decisão do prefeito Guti de revogar o decreto que outorgava à Agende (Agência de Desenvolvimento e Inovação de Guarulhos) a gestão do Parque Tecnológico pegou de surpresa entidades representativas da cidade, pois a Agende, fundada em 1999, é uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), formada por representantes de diversos segmentos, inclusive de sindicatos de trabalhadores e do poder público, tendo sido criada na primeira gestão do então prefeito Elói Pietá (PT) para fomentar o desenvolvimento a partir da conjugação de expertises e interesses, tendo por modelo agências do mesmo tipo que funcionaram bem em outros municípios.
A Agende teve como primeiro presidente Wilson Veiga Arambul, que havia comandado a Asec (Associação dos Empresários de Cumbica); foi sucedido por Luis Roberto Mesquita, que fora presidente da ACE Guarulhos (ainda quando era Acig); depois, por Celso Masson, que representou o Setcesp (Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas), Daniele Pestelli, ex-diretor do Ciesp Guarulhos; Aarão Ruben de Oliveira, ex-presidente da Asec; e, por último, Laudirley Dourado (Didi), que teve de se afastar para tratamento de saúde, sendo substituído pelo advogado Roberto Marchiori, ambos também da Asec.
Em seu histórico, consta ter gerenciado a Escola Técnica Federal de Guarulhos, de 2000 a 2005; em 2001, foi criado o CPT (Centro de Preparação Tecnológica), que funcionou anexo à Federal e depois foi transferido para outros locais; em 2005, instalada a Incubadora de Guarulhos. Ao longo do tempo, a Agende participou ativamente de movimentos como o Sim Guarulhos, no sentido de atrair empresas para a cidade, atuou em conjunto com outras iniciativas como a ONG Viva Guarulhos. E, nas gestões de Pestelli e Aarão, mobilizou-se para possibilitar que a cidade passasse a contar com um Parque Tecnológico, atuando como interlocutora entre o Município e o Estado, já que, por serem entes governados por partidos diferentes, havia arestas que precisavam ser aparadas. Como conquista, houve o acordo para transferência de áreas da Dersa (do Estado) ao Município, na Cidade Satélite de Cumbica, como dação de pagamento de tributos, com a finalidade específica de construção do Parque Tecnológico.
Esse trabalho e a manutenção da Incubadora credenciaram a Agende a pleitear da Prefeitura que viesse a ser a gestora do Parque Tecnológico, o que foi oficializado pelo então prefeito Sebastião Almeida, no final de seu mandato, com o decreto ora revogado pelo prefeito Guti.
Como essa revogação não foi informada aos órgãos de Imprensa e só chegou ao conhecimento da Agende e das entidades e empresas a ela associadas por meio do Diário Oficial, o Click Guarulhos enviou para a Assessoria de Imprensa e ao presidente em exercício da Agende, Roberto Marchiori, uma série questões, aqui reproduzidas com as respectivas respostas.
RESPOSTAS DA PREFEITURA
Essa decisão foi comunicada previamente e oficialmente à Diretoria da entidade?
A Diretoria da entidade estava ciente dos vícios que o Decreto continha, questão que foi discutida em diversas reuniões realizadas durante o ano de 2017. Em uma reunião específica, presentes o presidente da Agende, Roberto Marchiori, o então diretor técnico da Agende, professor Devanildo Damião, que agora exerce o cargo de gestor de Políticas Municipais no Departamento de Ciência, Tecnologia e Inovação (DCTI) da Sdceti, o diretor do DCTI, Marcelo Rezende e o secretário de Sdceti, Rodrigo Barros, foi colocado de forma clara que o encaminhamento da Secretaria seria pela revogação do Decreto. No que tange à informação documental à entidade, esta não se fazia necessária, considerando que o processo administrativo que tratava do assunto, apesar de público, é um trâmite interno da PMG e a forma de comunicação oficial dos atos do Executivo é o Diário Oficial do Município, que dá ciência à sociedade como um todo.
Quais as razões que levaram o prefeito a tomar tal decisão?
O prefeito acolheu posicionamento da Procuradoria do Município, que apontou nulidade do dispositivo no que se referia à destinação da gestão a uma entidade não governamental específica – no caso a Agende – por ir contra o que determina o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, Lei 13.019/2014, que entrou em vigor para os Municípios no ano de 2017 e obriga que tal ato seja sempre precedido de Chamamento Público. As manifestações destes órgãos se deram no âmbito dos Processos Administrativos nº 66.965/2016 e 40412/2017. Além disso, ainda que a gestão do Parque permanecesse com a Agende, o Decreto era claro na determinação de celebração de convênio entre a Entidade e a PMG para repasse de recursos a fim de garantir a execução do projeto, o que não é condizente com a realidade orçamentária da Prefeitura no momento.
Acolheu também manifestação do Departamento de Ciência, Tecnologia e Inovação – DCTI da Sdceti, que conforme o Artigo 85 inciso III da Lei 7550/2017, que reestruturou o Executivo Municipal em maio de 2017, é o órgão competente para:
“III – coordenar as principais atividades de CT&I no município, visando propiciar um ambiente que resulte na geração de empresas intensivas ou de base tecnológicas como polos e Parques Tecnológicos, além de incentivar a criação de centros geradores de conhecimento como universidades, escolas tecnológicas, museus”
O DCTI apontou que a manutenção dos demais dispositivos do Decreto 33.859/2016, uma vez reconhecida a nulidade no que se refere à determinação de entidade, já que não houve Chamamento Público, não seria conveniente e mesmo criaria obstáculos para que a pasta desempenhasse sua função.
A quem a Administração pretende delegar essa tarefa?
Como já indicado, a competência para coordenar as atividades de Ciência, Tecnologia e Inovação no Município, conforme a nova estrutura do Executivo Municipal, é do DCTI da Sdceti. O DCTI realizou em 2017 avanços sensíveis no que se refere à temática dos centros de inovação, como o apoio no credenciamento do primeiro Centro de Inovação Tecnológica do Município perante o Governo do Estado, o Citig operado pela Innovation, braço sem fins lucrativos do Grupo Eniac, passo importante para que o Município atenda aos requisitos do Decreto do Sistema Paulista de Ambientes de Inovação – Spai, Decreto Estadual 60286/2014, para credenciamento provisório do Parque Tecnológico.
Quanto ao Projeto do Parque Tecnológico, ainda é muito cedo para falar qual será a entidade que irá gerir o equipamento, uma vez que, sem Centro de Inovação Tecnológica credenciado, não era nem mesmo possível buscar o credenciamento provisório. Esse credenciamento provisório do Parque pode ser buscado pela própria Prefeitura, mas a operação do Parque deverá ser feita necessariamente por entidade sem fins lucrativos, conforme estabelece o Decreto do Spai. A interação da Sdceti com quaisquer entidades da sociedade civil sem fins lucrativos deverá ser pautada no Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil e nos princípios lá expostos, ou seja, a Sdceti realizará um Chamamento Público, provavelmente na modalidade de PMI, para o recebimento de estudos, em nível de pré-projetos para o Parque, garantindo assim ampla possibilidade de participação, inclusive, da própria Agende. Tais estudos deverão se mostrar compatíveis com as regras do Spai e principalmente financeiramente sustentáveis, sem depender exclusivamente de aportes do poder público.
Quais medidas estão sendo tomadas para evitar a invasão da área, cujo domínio para a cidade foi obtido com imenso trabalho pelo empresariado da cidade, capitaneado pela Agende e pela Asec?
Primeiramente, é preciso destacar que a atuação do empresariado da cidade foi e continuará sendo de grande relevância no desenvolvimento de iniciativas de Ciência, Tecnologia e Inovação no Município. O avanço da pauta de CT&I durante os anos que passaram, incluindo aí a destinação de áreas com a finalidade específica de implantação de Parque Tecnológico, se deve em grande parte à preocupação do empresariado e da atuação de entidades como a Asec e o foco da Agende.
O Executivo Municipal só passou a ter uma pasta dedicada inteiramente ao tema neste ano de 2017; então, sem a iniciativa destes atores o tema não teria tido o avanço que teve.
O terreno do Parque Tecnológico é em parte próprio Municipal, dado em pagamento pela Dersa para quitação de débitos de IPTU, e em outra parte próprio do governo do Estado, que foi cedido ao Município pelo prazo de 90 anos, com a finalidade específica de implantação de um Parque Tecnológico. A Lei 7395/2015, que autoriza o Executivo Municipal a criar o Parque Tecnológico de Guarulhos, especifica as matrículas dessas áreas e grava sua finalidade.
Os terrenos estão sob a gestão do Município e têm finalidade de interesse público definida em Lei. Assim como os demais bens do Município, a área está sob a proteção da Guarda Civil Municipal, que teve relevante atuação durante a tentativa de ocupação da área pelo movimento MTST, que ocorreu na madrugada do dia 8 de abril de 2017, um sábado. A Guarda Civil atuou com agilidade em defesa do próprio municipal e foi montada uma sala de situação que coordenou as ações para a desocupação da área: no mesmo final de semana já estava desocupada.
Quais os próximos passos para que o sonho de Guarulhos de ter o Parque Tecnológico saia do papel?
O primeiro grande passo já foi dado com o credenciamento do primeiro CIT na cidade. Esta era uma pendência desde o ano de 2014, quando houve a primeira tentativa de credenciamento provisório do Parque perante o Estado. Antes do Decreto do Spai, a existência de CIT credenciado não era requisito, mas isso mudou na mesma época em que o pleito foi apresentado. Desde então, a Agende buscava apoio para realização de estudos para a implantação do CIT junto ao Estado, mas não foi possível a liberação de verbas.
Quando a Sdceti foi criada, no início desta gestão, a principal missão do DCTI era compreender o status dessas questões e buscar formas de viabilizar o avanço da pauta de criação de ambientes de inovação na cidade. Fizemos visitas a diversos municípios e percebemos que um ambiente de inovação não precisava necessariamente ser uma estrutura operada pelo poder público. O DCTI passou a adotar a estratégia de buscar entidades privadas com interesse em criar e operar seu próprio Centro de Inovação Tecnológica, e a Innovation – braço sem fins lucrativos do grupo Eniac – foi a pioneira neste aspecto. Cabe destacar, porém, que não existe um limite ao número de CITs no Município e acreditamos que Guarulhos tem o potencial de abrigar muitos mais.
O DCTI está de portas abertas para orientar demais interessados e dar apoio institucional aos projetos que se mostrem viáveis. Infelizmente, porém, não dispomos de recursos para investimento direto – a situação financeira do Município é de amplo conhecimento público.
Outro fator determinante para a conquista do Parque Tecnológico em Guarulhos é a manutenção da nossa Incubadora de Empresas de Base Tecnológica, que é gerida pela Agende, é por ela já credenciada junto ao Spai, também pré-requisito para o credenciamento provisório do Parque. Nesse âmbito, a Sdceti efetuou o pagamento do aluguel do imóvel onde está instalada a Incubadora, que já estava com 15 meses de atraso, e agora busca a renovação desse contrato. Além disso, temos buscado soluções para que seja restabelecido um Instrumento Jurídico que traga a segurança necessária para esse importante ambiente de inovação, e trabalhado em um plano de revitalização da mesma.
RESPOSTAS DA AGENDE
A decisão foi comunicada previamente e oficialmente à Diretoria da entidade?
Inicialmente, cabe destacar que queremos apoiar o Município e o Prefeito, e temos a certeza de que temos condições de colaborar, pois ao longo dos anos tivemos lideranças que conhecem muito a cidade e podem contribuir. Pessoas como o Arambul, Luis Roberto Mesquita, Laudirley Dourado, Cravo Roxo, Rosmary Ghelery, Aarão Ruben, Celso Masson, Marcio Pacheco, Junior Araújo, Tayguara Helou, Danilo Ramalho, Jorge Taiar, Loredana Glasser, Edson da Forseti, dentre inúmeros outros, fazem parte desta história.
Informalmente, tínhamos notícia da intenção da Prefeitura e também estávamos cientes que o governo anterior não teve todos os cuidados preparatórios para operar os elementos descritos no Decreto.
A meu ver, o que causou um estranhamento foi a não realização de reuniões para propor alternativas. A Agende não é uma entidade em si mesma: ela responde aos objetivos de várias entidades e o Parque Tecnológico foi concebido com esse propósito.
Logicamente, pela representatividade de nossos associados e o trabalho já realizado, seria interessante uma reunião para formalizar discussões deste tipo.
Quando aparece uma decisão como essa, existe uma grande movimentação da sociedade: Imprensa, vereadores, entidades com as quais temos convênios, associados, Incubados, funcionários, e perde-se energia para explicações.
Mas fica a expectativa otimista, pois o prefeito Guti sempre foi aberto ao diálogo e possivelmente deverá abrir uma agenda para conversar conosco sobre isto. O secretário Rodrigo Barros manifestou interesse em colaborar para solucionar a situação da Agende e acreditamos em boas notícias brevemente.
Em sua opinião, quais as razões que levaram o prefeito a tomar tal decisão?
O prefeito é bem intencionado e acredito que a decisão foi devido à forte rotina operacional. Ele assinou um documento durante a campanha, no qual firmou o seu compromisso com o Parque Tecnológico e considerava a Agende como entidade que reúne todas as condições técnicas para sua gestão. A pauta da inovação como instrumento de desenvolvimento econômico foi colocada pela Agende em 2011 e a Incubadora existe desde 2005. Acredito que ele deve ter obedecido alguma recomendação jurídica pontual, mas, conforme as próprias palavras, a Agende deve prosseguir ajudando a cidade nesse processo. O próprio governo alterou a Secretaria de Justiça para melhorar os processos legais, e acreditamos na competência do Dr. Airton Trevisan, que saberá conduzir esse processo.
Crê que a Administração pretende delegar a quem essa tarefa?
Permita-me fazer algumas observações conceituais: 1. O Estado não consegue operar processos inovativos; a Lei 8.666/93 foi sancionada com a perspectiva de assegurar a legitimidade de compras, ela é lenta e não consegue operar ambientes de inovação. Isso é um fato; 2. O Estado e Prefeituras devem ser enxutos; não é possível aumentar a máquina, isso é contrário à eficiência da máquina pública, deve-se somente formular estratégias e a operação e gestão ser delegada a entidades com competência local. Em 2014, mudou-se a forma de fazer entidades sem fins econômicos com a Lei 13.019/2014. Todavia, o novo marco regulatório permite fazer ajustes legais com entidades de ICT como a Agende por meio da Lei nº 13.243, de 11 de janeiro de 2016.
Quais medidas crê que sejam tomadas para evitar a invasão da área, cujo domínio para a cidade foi obtido com imenso trabalho pelo empresariado da cidade, capitaneado pela Agende e pela Asec?
Houve uma mobilização muito grande das entidades para evitar invasões no local. A propriedade do terreno é pública, e foi dada à Agende a gestão do espaço, sem nenhum recurso em contrapartida, sendo impossível fazer melhorias no local.
A sociedade tem ciência de que o Parque Tecnológico trará benefícios para a cidade como um todo e não somente para um grupo específico. No mais recente ranking de cidades empreendedoras, Guarulhos não aparece, e isso deve ser objeto de muita preocupação, não apenas do poder público, mas de toda a sociedade organizada. Enquanto isto, cidades que possuem Parques Tecnológicos, como Campinas, Ribeirão Preto e Sorocaba, ocupam posições de destaque nesse ranking. Temos de estar unidos e procurar reverter esse quadro; esse é o desafio da Agende, que sempre pensou na necessidade de reunir pessoas capacitadas.
Quais os próximos passos para que o sonho de Guarulhos ter o Parque Tecnológico saia do papel?
A Agende avançou muito neste processo; colocou como pauta a inovação na cidade e influenciou todos os planos de Governo. A pauta do Parque Tecnológico vai além da Agende: é do Município. Também já temos a Incubadora credenciada que é o ambiente mais complexo para credenciamento; recebemos com alegria a notícia de que o Centro de Inovação do Eniac foi credenciado. Digo isto, pelo fato que o Estado tinha aprovado recursos de R$ 200 mil para os Estudos na Incubadora e demorou para entregar, e por isto não prosseguimos em nosso centro de inovação.
Também temos a expectativa de continuidade do projeto da Incubadora com a revitalização da mesma, pois isso é essencial para a concretização do projeto do Parque Tecnológico.
Conclusão
Uma cidade do porte de Guarulhos já deveria ter um Parque Tecnológico há muitos anos, pois são inegáveis os benefícios que um equipamento como esse traz para toda a comunidade, com ênfase para ampliar os horizontes para os jovens habitantes e para colocar as empresas locais em posição de igualdade para competir no mercado, gerando empregos e arrecadação para a cidade.
Espera-se que interesses políticos ou pessoais não se sobreponham aos da coletividade, que vaidades sejam deixadas de lado e que os setores envolvidos não esmoreçam até que esse sonho seja concretizado.
A Sdceti, a quem está confiado cuidar do assunto, deve ter esse objetivo como uma de suas principais metas. E a sociedade civil organizada deve manter-se firme para cobrar atitudes dos governantes, sob pena de ver naufragar todo o esforço que foi feito até então.
Valdir Carleto