Por: Cris Marques
Fotos: arquivo pessoal e divulgação
Feitos de crochê ou tricô, os amigurumis, bonecos criados a partir dos pontos da linha, com formas humanas ou de animais, têm ganhado a internet. Com um nome que é uma junção de palavras – ami significa malha/tecer e nuigurumi boneco com enchimento –, a técnica japonesa é quase tão antiga quanto o próprio artesanato feito com agulhas, mas ressurgiu no Japão nos anos 80, ganhou força em 2002, com a criação da Associação Japonesa de Amigurumi, e tem conquistado os brasileiros, que procuram itens diferentes e personalizados para presentear ou decorar.
O primeiro contato da psicóloga Bianca Moraes com um bichinho assim foi em 2009, na internet, e o que se tornou uma curiosidade, hoje, já é até empreendedorismo. “Nunca gostei de crochê. Achava feio, mas me encantei com a peça. Comecei a buscar e não encontrava nenhum lugar que ensinasse a fazer um, até que os tutoriais em inglês e espanhol foram surgindo. Aprendi a fazer mesmo só em 2011, com ajuda dos vídeos on-line e da minha mãe, que não fazia amigurumis, mas sabia a arte das linhas. A partir daí, o interesse só aumentou”, conta.
Depois da dificuldade que teve em achar instruções, ela, que já tinha um blog e um canal no Youtube, acabou criando uma série de vídeos só para ensinar a fazer os bonequinhos. “Não conhecia nenhum material que ensinasse do zero, para quem nunca tinha feito. Não é uma técnica muito simples, mas eu tinha fé de que com um passo a passo bem didático e imagem clara, as pessoas conseguiriam. Ensino outras coisas também, mas a demanda pelos amigurumis é tão alta que isso acabou se tornando o carro-chefe”.
Com o sucesso, Bianca ainda criou um grupo no Facebook sobre o assunto, o Amigurumi Brasil, que já conta com 12 mil membros e posts com dúvidas, fotos das criações próprias, discussões sobre direitos autorais, links úteis e receitas gratuitas e autorais, e ainda pretende criar um curso on-line para 2017. “Sou muito apaixonada por toda e qualquer forma de expressão artística e manual. Pra mim, é quase como meditar. Inclusive, existem muitas pesquisas que relacionam artesanato com meditação, já que ambos têm efeitos muito parecidos no nosso corpo, como redução de estresse e ansiedade”, ressalta.
Prática democrática
Foi por meio de um projeto da Universidade Anhembi Morumbi, em parceria com o hospital Pérola Byington, que Paulo Estevão Samú, designer de moda, entrou em contato com as linhas e agulhas. Pesquisando novas técnicas, ele conheceu os amigurumis e criou sua própria marca, a Ponto Pipoca, que acaba de completar um ano. Com uma loja na plataforma Elo 7 e pedidos sob encomenda, ele cria miniaturas de personagens famosos de filmes, séries e desenhos (tem Star Wars, super-heróis, Pokémon, Game of Thrones e até Disney), personalidades, órgãos humanos, recifes de corais, cabeças de animais e acessórios, tudo em crochê. Mas o que mais faz sucesso são as peças personalizadas. “O tipo de pedido que mais recebo é ‘faz meu cachorro, minha namorada, meu periquito?’. E eu adoro, porque é como uma caricatura, tenho que capturar as características mais marcantes da pessoa”, diz.
Sobre não ser muito comum ver homens envolvidos com crochê, Paulo conta que a arte foi uma forma de refletir sobre assuntos mais polêmicos e até de se expor. “Há até algum tempo atrás, não entendia direito os conceitos do feminismo e, por meio da prática da técnica, encontrei pessoas incríveis que me trouxeram questões sobre igualdade de gênero. Por que é estranho alguém do sexo masculino praticando a arte? Por que as agulhas são pequenas e não encaixam direito nas mãos maiores? Por que a moça do armarinho me olha engraçado quando eu vou comprar lã? Ainda não sofri preconceito verbal, mas é notável a quantidade de olhares que recebo de gente achando estranho e julgando. Mas, quanto mais as pessoas não tiverem vergonha de ser julgadas, mais elas vão aprender que não têm motivo para julgar e que todo mundo tem algo legal pra ensinar e aprender com o outro”, enfatiza.
Arte universal
Apaixonada por artes manuais, a guarulhense Elza Helena Marques, professora e psicóloga, sempre gostou de criar coisas novas. “Vendia touquinhas de tricô para bonecas quando criança. Acredito que foi meu primeiro negócio. Hoje, faço ponto cruz, patchwork, orinuno [origami com tecido] e outros”. No meio do ano passado, nas férias de julho, ela começou a fazer crochê por meio de cursos no Youtube e acabou aprendendo a fazer amigurumis. “Trabalhos manuais estimulam o bom funcionamento do pensamento e raciocínio e, com o uso da internet, tudo ficou mais fácil, até porque não achei nenhum curso de bichinhos de crochê em lojas de artesanato, pelo menos não aqui na cidade. Com a prática, montei algumas receitas autorais, fora o fato de começar a compreender as que estão em inglês, espanhol e até holandês. Arte é universal. Depois de algumas encomendas, criei um perfil no Instagram e agora vejo como uma possibilidade de renda extra, além de ser uma ótima terapia”, finaliza.